Pronunciamentos
Autor | Ramez Tebet (PMDB - Partido do Movimento Democrático Brasileiro /MS) | ||||
Data | 17/01/2006 | Casa | Senado Federal | Tipo | Discurso |
O SR. RAMEZ TEBET (PMDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estamos de volta para cumprir com nosso dever.
Venho hoje a esta tribuna, como primeiro orador inscrito, por cessão ou permuta com o Senador Marco Maciel - meus agradecimentos a este grande homem público do Brasil -, para fazer algumas reflexões sobre um assunto de natureza internacional: a presença das tropas brasileiras no Haiti, país de tanto sofrimento, de tanta dor, de povo faminto - por que não dizer miserável? -, que tem de ter um lugar ao sol.
Não quero discutir se o Brasil acertou ou errou. O assunto foi amplamente debatido nas duas Casas do Congresso Nacional. Em verdade, as tropas brasileiras e o comando das tropas da ONU que se encontram no Haiti têm uma missão de paz a cumprir para ajudar aquele povo.
A essa altura dos acontecimentos, algumas reflexões precisamos fazer. Volto a repetir que não quero discutir se o Brasil agiu certo ou errado em estar com suas tropas lá no Haiti - esse é assunto ultrapassado, nós já estamos lá -, nem mesmo os verdadeiros motivos que levaram o Brasil a enviar tropas para o Haiti: se foi para melhorar a nossa imagem internacional, se foi para conquistar o lugar no Conselho de Segurança Nacional. O objetivo que vem sendo perseguido pelo Brasil encontra adversários até mesmo na América do Sul, como Argentina. Portanto, um intento difícil de ser alcançado.
Mas, em verdade, as tropas brasileiras estão lá e os resultados, Sr. Presidente e Srs. Senadores, não parece que estão sendo alcançados, apesar das eleições que estão marcadas para o dia 7 de fevereiro naquele País. Tampouco estou nesta tribuna porque um general da estirpe, da envergadura moral, da envergadura intelectual de quem comandava as tropas da Onu, general brasileiro da melhor cepa, homem estimado dentro das Forças Armadas, reconhecidamente competente, já perdeu a sua vida supostamente através de um ato praticado por ele próprio, ou seja, o suicídio.
Isso nos ajuda a refletir? Ajuda sim. Porque a imprensa dá notícia de que os soldados brasileiros que lá se encontram estão insatisfeitos, angustiados. Em verdade, parece-me que, decorrido tanto tempo, nós não estamos vendo um projeto consistente. A Organização das Nações Unidas não dá demonstrações nem exibe ao mundo um projeto consistente para ajudar os nossos irmãos haitianos. Constitucionalmente, as Forças Armadas são responsáveis pela segurança interna do Brasil, pelo combate ao narcotráfico, aos seqüestros - e os seqüestros relâmpagos no Brasil têm aumentado -, aos bandidos que estão afrontando os policiais brasileiros, e já estão afrontando também São Paulo, onde policiais brasileiros são vitimados por bandidos da pior espécie.
Se nós não estamos cuidando da nossa própria casa, como é que estamos lá? Temos que refletir ou não sobre a nossa presença no Haiti? Dir-se-á, de um lado, como diz o próprio Itamaraty, que estamos lá em missão de paz. E digo eu: e o Brasil tem mesmo vocação pacífica, o Brasil tem mesmo espírito de solidariedade, o Brasil é um pátria de respeito aos direitos humanos.
Mas, Sr. Presidente, não está acontecendo nada no Itamaraty, parece que as coisas estão piorando por lá. E não sabemos como vamos voltar, e as coisas estão acontecendo aqui dentro. As nossas Forças armadas estão sofrendo com isso, eu tenho certeza. Por que elas estão sofrendo com isso? Porque estão com os seus vencimentos muito baixos; porque as estruturas bélica e material das nossas Forças Armadas estão ao chão, não existem mais. Os nossos armamentos estão ultrapassados. Não fora a disciplina e hierarquia das nossas Forças Armadas, nós estaríamos ouvindo declarações a nós confidenciadas pelos militares, tão dramática é a sua situação!
Pois bem, Sr. Presidente, então nós temos que pensar, sim. Será que, com a realização das eleições a 7 de fevereiro, a ONU terá cumprido a sua missão no Haiti? Será que essas eleições serão suficientes? E quem não quer eleições? Mas será que elas serão suficientes para trazer de volta nossos soldados? Nós estamos ali, mas temos de refletir. Nós temos que sair dali. A emenda pode ser pior que o soneto, Sr. Presidente, porque nós já estamos ali. Não podemos abandonar o barco, mas também não podemos ficar lá fazendo um papel de comandante das Forças da ONU sem solução para resolver a miséria, o analfabetismo, o sofrimento dos nossos irmãos do Haiti.
O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Ramez Tebet?
O SR. RAMEZ TEBET (PMDB - MS) - Somente um minuto, Senador.
A ONU não tem condições para isso. Onde estão os grandes países, os desenvolvidos? Bélgica, França, Estados Unidos, Canadá, Inglaterra? Cadê esse projeto?
Venho a esta tribuna, Senador Mão Santa - e já vou lhe conceder o aparte -, porque acho que é o nosso dever, como Senadores, fazer isso. Ainda mais porque temos conhecimento de muita coisa de que às vezes se fala e que não está esclarecido. As Forças Armadas foram mesmo ouvidas para ir para lá? Até disso se duvida. Até isso a Imprensa Nacional comenta.
Temos que arrumar a nossa própria Casa também. As nossas fronteiras estão desguarnecidas. Sou do Estado de Mato Grosso do Sul. Nós fazemos fronteira com o Paraguai, fazemos fronteira com a Bolívia e, graças a Deus, vivemos em paz. Vivemos em paz, mas vivemos como corredor de contrabando: contrabando de arma, contrabando de narcotráfico, banditismo. Então, penso que temos que refletir. Já foram gastos, Senador Mão Santa, R$ 350 milhões nessa missão - é o que a imprensa noticia. O Brasil já gastou R$ 350 milhões. Será restituído disso? Diz-se que parte será, diz-se que será. Mas e a aplicação desses recursos aqui no Brasil?
O que quero é que pelo menos haja utilidade das presenças das nossas tropas no Haiti. Queria ter convicção de que a ONU vai resolver o problema do Haiti. Queria ter convicção de que a ONU será respeitada, de que tem um projeto que fará ser comprido. Queria ter convicção de que as grandes potências, que esbanjam dinheiro, que jogam recursos fora - vejam o ataque dos Estados Unidos ao Iraque! -, têm um projeto para ajudar a evitar a criminalidade no Haiti, mas, mais do que isso, Sr. Presidente, para exercer uma efetiva ação social no Haiti, porque ninguém combate a violência, nem no Haiti, nem no Brasil, nem em lugar nenhum, se não houver concomitantemente ações sociais que possam fazer um povo viver com dignidade.
Pois não, Senador Mão Santa.
O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Ramez Tebet, o pronunciamento de V. Exª é igual ao de Rui Barbosa lá em Haia. É um interesse internacional que leva o mundo à paz. Mas eu queria advertir aqui: bem que Napoleão Bonaparte disse que a maior desgraça é você exercer um cargo para o qual não está preparado. O nosso Presidente da República decidiu, após um telefonema de Jacques Chirac, de supetão, mandar mil e duzentos. Não combinou, não consultou o Exército, não consultou o Itamaraty. Sonhava mostrar poder internacional com uma cadeira conquistada na ONU. E aí está o resultado. E fez isso sem a mínima noção do que é a vida militar, porque nem serviço militar prestou. Posso falar, porque sou Oficial da Reserva não remunerado, fiz o CPOR. A ignorância é audaciosa. E olhem a falácia: um mártir, assim como Getúlio Vargas, o General Bacellar. E digo que um quadro vale por dez mil palavras, tal a irresponsabilidade: lá na capital do Haiti, ele estava comandando 3,6 mil soldados, da capital, Porto Príncipe; em Brasília, aqui, são 23 mil soldados para uma igual população, na paz. Então, era uma missão impossível. E esse foi o caminho que ele encontrou para chamar a atenção do mundo e do nosso País para tamanha irresponsabilidade.
O SR. RAMEZ TEBET (PMDB - MS) - Senador Mão Santa, o aparte de V. Exª é de muita objetividade. E é verdade mesmo: temos muitos haitis dentro do Brasil. Temos de refletir, sim. Não estou dizendo que o Brasil, neste mundo globalizado - longe de mim afirmar isso -, não deva colaborar com os nossos irmãos, com aqueles que mais necessitam. Mas dever colaborar com uma finalidade, com um resultado prático, com um resultado que possa realmente trazer benefício aos nossos irmãos e não assim como estamos colaborando, ao léu, com tantos haitis aqui dentro do nosso Brasil.
O Sr. Almeida Lima (PMDB - SE) - Senador Ramez Tebet.
O SR. RAMEZ TEBET (PMDB - MS) - Quanta violência!
O Sr. Almeida Lima (PMDB - SE) - Senador Ramez Tebet, V. Exª me permite um aparte?
O SR. RAMEZ TEBET (PMDB - MS) - Pois não, Senador.
O SR. PRESIDENTE (João Alberto Souza. PMDB - MA) - Conclua, Senador, por gentileza.
O Sr. Eduardo Siqueira Campos (PSDB - TO) - Eu havia solicitado anteriormente.
O SR. RAMEZ TEBET (PMDB - MS) - Com prazer, Senador Almeida Lima.
Logo a seguir, V. Exª, Senador Eduardo Siqueira Campos.
O Sr. Almeida Lima (PMDB - SE) - Quero me congratular com o pronunciamento de V. Exª e dizer que, diante do fato que ocorreu no Haiti com o Comandante das Forças Brasileiras que lá se encontrava, tive o cuidado de, pela Internet, na minha página do Senado, rememorar o pronunciamento que fiz naquela noite, quando esta Casa estava para deliberar acerca do encaminhamento das tropas brasileiras ou não àquele País. E recordo-me de que, naquela oportunidade, além de ter votado contra, manifestei-me contrário àquela posição, àquele desejo do Governo brasileiro, dizendo mais, dizendo aquilo que V. Exª acaba de dizer: o Governo brasileiro não pode se excluir da globalização, do mundo globalizado e de uma atitude de solidariedade, mas, antes de soldados, aquele povo precisava de médicos, de medicamentos, de assistência humanitária. E o Brasil poderia fazer dessa forma, deixando para o xerife do mundo fazer o papel que não temos, por tradição, o costume de fazer. Muito obrigado.
O SR. RAMEZ TEBET (PMDB - MS) - Senador Almeida Lima, eu bem me recordo das palavras de V. Exª, quando o assunto foi votado aqui no Senado da República. V. Exª realmente se opunha, e se opunha com a solidez de argumentos que caracteriza a sua atuação aqui nesta Casa.
Ouço o Senador Eduardo Siqueira Campos.
Sr. Presidente, já fui advertido gentilmente por V. Exª, mas é o último aparte que estou concedendo.
O Sr. Eduardo Siqueira Campos (PSDB - TO) - Vou procurar fazê-lo dentro do tempo. Em primeiro lugar, quero parabenizar V. Exª, Senador Ramez Tebet. Meu aparte é no mesmo sentido das palavras que proferiu o nobre Senador Almeida Lima. Fui, Senador Ramez Tebet, enviado por esta Casa como observador junto à ONU, no período de 16 a 19 de novembro de 2004. Estando lá, além de ter participado do lançamento do Ano Internacional do Microcrédito, fui convidado para uma reunião com adidos militares brasileiros, conselheiros junto à ONU, que me chamavam atenção, na condição de membro integrante do Senado, de que o Brasil que assumiu essa responsabilidade, que, na verdade, é da ONU, mas que foi corroborado por esta Casa pelo Decreto de nº 207, de 2004, tinha no seu bojo toda esta intervenção muito mais revestida de um caráter humanitário do que militar, as pré-condições de investimento em infra-estrutura, saneamento básico, educação, saúde. Colocar um país para chefiar uma missão, desacompanhado dessas outras medidas é seguramente condenar este País a uma situação de extremo perigo para a sua tropa. Esta é a maior missão brasileira militar para o nosso País depois da Segunda Guerra Mundial. Imagine V. Exª que, desacompanhado da infra-estrutura, que é papel da ONU e não do Brasil, de fazer investimento em saneamento básico, na recuperação social do Haiti, o Brasil está à frente de uma missão inglória. A tensão dos nossos militares me foi transmitida, e a fiz constar de um relatório, porque se fui enviado a ONU por esta Casa, Senador Ramez Tebet, sinto-me na obrigação de em qualquer missão que realizo no exterior de trazer um relatório para o Presidente desta Casa. E eu remeti, dentro das minhas considerações acerca do que vi na Organização das Nações Unidas, naquela data, esta preocupação dos militares, dos adidos militares brasileiros junto à ONU de que o Brasil cobrasse com veemência que a ONU cumprisse a resolução que enviou a missão ao Haiti. De outra forma deixaria o Brasil muito mal.
O SR. RAMEZ TEBET(PMDB - MS) - Senador Eduardo Siqueira Campos, felizmente encerro meu pronunciamento. Digo felizmente, porque o aparte de V. Exª tem toda a procedência. Os jornais do mundo e a imprensa brasileira estão noticiando que o seqüestro, as mortes, a fome e a miséria, mas eu não li nenhuma notícia de nada que se refira à infra-estrutura, à tentativa da solução de problemas sociais dos nossos queridos irmãos haitianos.
Por fim, são essas as considerações que queria fazer. Agora, não posso, como ser humano, tendo tantos amigos nas nossas Forças Armadas, descer desta tribuna sem deixar aqui a minha homenagem ao general falecido Urano Teixeira da Matta Bacellar. E também, Sr. Presidente, o destino tem sido assim,...
(Interrupção do som.)
O SR. RAMEZ TEBET (PMDB - MS) - ... às vezes penso que vou falar um assunto de interesse internacional e fico sem jeito, porque o destino me coloca pela frente aquilo que acho que tenho mais arraigado dentro de mim. Então, sobre este assunto, um jornal do meu Estado diz que estão sendo treinados soldados do Mato Grosso do Sul, o treinamento começará agora em março para aumentar ainda mais o efetivo das nossas forças no Haiti.
Comecei falando da ONU e encerro prestando minha homenagem a Mato Grosso do Sul, mas torcendo para que o Brasil encontre o tempo oportuno. E o tempo tem que ser oportuno mesmo, o momento é oportuno para não significar nem retirada, mas muito menos...
(Interrupção do som.)
O SR. RAMEZ TEBET (PMDB - MS) - ...fazer um papel que não compete ao Brasil, que é um papel simbólico dentro do Haiti, que é o que está acontecendo agora. E o Haiti, o Governo Federal e o próprio Itamaraty me permitam terminar desse jeito, estamos cumprindo um papel quando este papel que estamos cumprindo lá devia ser cumprido aqui dentro do Brasil em defesa da tranqüilidade, do sossego das nossas famílias.
Muito obrigado.
Secretaria de Informação e Documentação - Subsecretaria de Informações
Dúvidas, reclamações e informações: SSINF - Subsecretaria de Informações
(3311-3325, 3311-3572)
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