quinta-feira, 1 de maio de 2008

1° de maio

Depois de muito tempo longe de Blogs, Flogs e resolvi criar um novo blog para postar minhas reflexões, estudos, homenagens, desabafos, campanhas e tudo mais que possa ser interessante. Espero que gostem já que dessa data em diante eu assumo a culpa por ser um livre pensador um amante da liberdade de tudo que é bom e belo e um inimigo declarado da ignorância (até aquela que esta em mim), inimigo da tirania, inimigo da censura e inimigo de todo tipo de preconceito. Aproveitando que hoje é o dia do trabalhador ai vai um texto com sua história.


As Origens Trágicas e Esquecidas do Primeiro de Maio


Maio já foi um mês diferente de
qualquer outro. No primeiro dia desse mês as tropas e as polícias
ficavam de prontidão, os patrões se preparavam para
enfrentar problemas e os trabalhadores não sabiam se no dia
2 teriam emprego, liberdade ou até a vida.

Hoje, tudo isso foi esquecido. A memória
histórica dos povos é pior do que a de um octogenário
esclerosado, com raros momentos de lucidez, intercalados por longos
períodos de amnésia. Poucos são os trabalhadores,
ou até os sindicalistas, que conhecem a origem do 1° de
maio. Muitos pensam que é um feriado decretado pelo governo,
outros imaginam que é um dia santo em homenagem a S. José;
existem até aqueles que pensam que foi o seu patrão
que inventou um dia especial para a empresa oferecer um churrasco
aos "seus" trabalhadores. Também existem - ou existiam
- aqueles, que nos países ditos socialistas, pensavam que o
1° de maio era o dia do exército, já que sempre
viam as tropas desfilar nesse dia seus aparatos militares para provar
o poder do Estado e das burocracias vermelhas.

As origens do 1° de maio prendem-se com
a proposta dos trabalhadores organizados na Associação
Internacional dos Trabalhadores (AIT) declarar um dia de luta pelas
oito horas de trabalho. Mas foram os acontecimentos de Chicago, de
1886, que vieram a dar-lhe o seu definitivo significado de dia internacional
de luta dos trabalhadores.

No século XIX era comum (situação
que se manteve até aos começos do século XX)
o trabalho de crianças, grávidas e trabalhadores ao
longo de extenuantes jornadas de trabalho que reproduziam a tradicional
jornada de sol-a-sol dos agricultores. Vários reformadores
sociais já tinham proposto em várias épocas a
idéia de dividir o dia em três períodos: oito
horas de trabalho, oito horas de sono e oito horas de lazer e estudo,
proposta que, como sempre, era vista como utópica, pelos realistas
no poder.

Com o desenvolvimento do associativismo operário,
e particularmente do sindicalismo autônomo, a proposta das 8
horas de jornada máxima, tornou-se um dos objetivos centrais
das lutas operárias, marcando o imaginário e a cultura
operária durante décadas em que foi importante fator
de mobilização, mas, ao mesmo tempo, causa da violenta
repressão e das inúmeras prisões e mortes de
trabalhadores.

Desde a década de 20 do século
passado, irromperam em várias locais greves pelas oitos horas,
sendo os operários ingleses dos primeiros a declarar greve
com esse objetivo. Aos poucos em França e por toda a Europa
continental, depois nos EUA e na Austrália, a luta pelas oitos
horas tornou-se uma das reivindicações mais freqüentes
que os operários colocavam ao Capital e ao Estado.

Quando milhares de trabalhadores de Chicago,
tal como de muitas outras cidades americanas, foram para as ruas no
1° de maio de 1886, seguindo os apelos dos sindicatos, não
esperavam a tragédia que marcaria para sempre esta data. No
dia 4 de maio, durante novas manifestações na Praça
Haymarket, uma explosão no meio da manifestação
serviu como justificativa para a repressão brutal que seguiu,
que provocou mais de 100 mortos e a prisão de dezenas de militantes
operários e anarquistas.

Alberto Parsons um dos oradores do comício
de Haymarket, conhecido militante anarquista, tipógrafo de
39 anos, que não tinha sido preso durante os acontecimentos,
apresentou-se voluntariamente à polícia tendo declarado:
"Se é necessário subir também ao cadafalso
pelos direitos dos trabalhadores, pela causa da liberdade e para melhorar
a sorte dos oprimidos, aqui estou". Junto com August Spies, tipógrafo
de 32 anos, Adolf Fischer tipógrafo de 31 anos, George Engel
tipógrafo de 51 anos, Ludwig Lingg, carpinteiro de 23 anos,
Michael Schwab, encadernador de 34 anos, Samuel Fielden, operário
têxtil de 39 anos e Oscar Neeb seriam julgados e condenados.
Tendo os quatro primeiros sido condenados à forca, Parsons,
Fischer, Spies e Engel executados em 11 de novembro de 1887, enquanto
Lingg se suicidou na cela. Augusto Spies declarou profeticamente,
antes de morrer: "Virá o dia em que o nosso silêncio
será mais poderoso que as vozes que nos estrangulais hoje".

Este episódio marcante do sindicalismo,
conhecido como os "Mártires de Chicago", tornou-se
o símbolo e marco para uma luta que a partir daí se
generalizaria por todo o mundo.

O crime do Estado americano, idêntico
ao de muitos outros Estados, que continuaram durante muitas décadas
a reprimir as lutas operárias, inclusive as manifestações
de 1° de maio, era produto de sociedades onde os interesses dominantes
não necessitavam sequer ser dissimulados. Na época,
o Chicago Times afirmava: "A prisão e os trabalhos forçados
são a única solução adequada para a questão
social", mas outros jornais eram ainda mais explícitos
como o New York Tribune: "Estes brutos [os operários]
só compreendem a força, uma força que possam
recordar durante várias gerações..."

Seis anos mais tarde, em 1893, a condenação
seria anulada e reconhecido o caráter político e persecutório
do julgamento, sendo então libertados os réus ainda
presos, numa manifestação comum do reconhecimento tardio
do terror de Estado, que se viria a repetir no também célebre
episódio de Sacco e Vanzetti.

A partir da década de 90, com a decisão
do Congresso de 1888 da Federação do Trabalho Americana
e do Congresso Socialista de Paris, de 1889, declararem o primeiro
de maio como dia internacional de luta dos trabalhadores, o sindicalismo
em todo o mundo adotou essa data simbólica, mesmo se mantendo
até ao nosso século como um feriado ilegal, que sempre
gerava conflitos e repressão.

Segundo o historiador do movimento operário,
Edgar Rodrigues, a primeira tentativa de comemorar o 1 de maio no
Brasil foi em 1894, em São Paulo, por iniciativa do anarquista
italiano Artur Campagnoli, iniciativa frustrada pelas prisões
desencadeadas pela polícia. No entanto, na década seguinte,
iniciaram-se as comemorações do 1 de maio em várias
cidades, sendo publicados vários jornais especiais dedicados
ao dia dos trabalhadores e números especiais da imprensa operária
comemorando a data. São Paulo, Santos, Porto Alegre, Pelotas,
Curitiba e Rio de Janeiro foram alguns dos centros urbanos onde o
nascente sindicalismo brasileiro todos os anos comemorava esse dia
à margem da legalidade dominante.

Foram décadas de luta dos trabalhadores
para consolidar a liberdade de organização e expressão,
que a Revolução Francesa havia prometido aos cidadãos,
mas que só havia concedido na prática à burguesia,
que pretendia guardar para si os privilégios do velho regime.

Um após outro, os países, tiveram
de reconhecer aos novos descamisados seus direitos. O 1° de maio
tornou-se então um dia a mais do calendário civil, sob
o inócuo título de feriado nacional, como se décadas
de lutas, prisões e mortes se tornassem então um detalhe
secundário de uma data concedida de forma benevolente, pelo
Capital e pelo Estado em nome de S. José ou do dia, não
dos trabalhadores, mas numa curiosa contradição, como
dia do trabalho. Hoje, olhando os manuais de história e os
discursos políticos, parece que os direitos sociais dos trabalhadores
foram uma concessão generosa do Estado do Bem-Estar Social
ou, pior ainda, de autoritários "pais dos pobres"
do tipo de Vargas ou Perón.

Quanto às oitos horas de trabalho, essa
reivindicação que daria origem ao 1º de maio, adquiriu
status de lei, oficializando o que o movimento social tinha já
proclamado contra a lei. Mas passado mais de um século, num
mundo totalmente diferente, com todos os progressos tecnológicos
e da automação, que permitiram ampliar a produtividade
do trabalho a níveis inimagináveis, as oitos horas persistem
ainda como jornada de trabalho de largos setores de assalariados!
Sem que o objetivo das seis ou quatro horas de trabalho se tornem
um ponto central do sindicalismo, também ele vítima
de uma decadência irrecuperável, numa sociedade onde
cada vez menos trabalhadores terão trabalho e onde a mutação
para uma sociedade pós-salarial se irá impor como dilema
de futuro. Exigindo a distribuição do trabalho e da
riqueza segundo critérios de eqüidade social que o movimento
operário e social apontou ao longo de mais de um século
de lutas.



Jorge E. Silva
- Membro do Centro de Estudos Cultura e Cidadania - Florianópolis
(CECCA)


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